Nem o sol nem a chuva e, mesmo envergonhada, admito que nem o time. Minhas mais remotas lembranças se perdem nos três Gigantes daquelas tardes de infância: o senhor negro com gigantes mãos, cujas palmas ecoavam como trovões na arquibancada; a gigante construção à beira rio, que identificava e segurava aquele mar vermelho de alegrias e prantos; e o mais gigantesco homem da minha vida, que me ensinou o amor colorado.
Alto, magro e negro, aquele desconhecido torcedor possuía cabelos grisalhos e longuíssimos dedos. Suas mãos me lembravam raquetes de tênis. Seu sorriso era proporcional a elas, assim como sua tristeza. Ele sempre ficava no mesmo lugar, encostado na parede do último degrau da arquibancada inferior – portão 02. Em determinados momentos, e não saberei precisar se por minhas piruetas ou por algum movimento da bola longínqua e branca no meio do campo, ele esticava suas mãos ao extremo e batia palmas. Eram trovoadas que vibravam o estádio e meu coração.
Este som só perdia em grandeza quando o Gigante urrava e gritava e cantava e mostrava o poder de suas milhares de vozes juntas. Éramos poucas dúzias por vezes, ou centenas delas. Meu grito se unia aos outros, indiferente ao motivo, independente da situação. Aos cinco anos, não há criança que precise de razões para berrar, pular e acompanhar seu ídolo na alegria e na dor.
Aos cinco anos, minha felicidade era saber que nosso time faria, com certeza, nascer rugas e, talvez, roubar sorrisos do maior homem do mundo: nós somos os de vermelhos, né, pai? O clichê da vida mantém-se aqui, como na maioria das histórias de amor. Ao me levar pela mão ao estádio e me soltar logo depois de adentrarmos ao caldeirão, meu pai queria me apaixonar.
Não ouso dizer que eu sabia o que acontecia nos gramados. Não entendia o objetivo dos chutes, da bola ou do homem do apito. Meu entrosamento era com os degraus, com a camisa que eu inventava bandeira, com as descobertas mágicas naquele concreto. Naquela época eu era o sentimento que compartilhava com meu pai, era a onda vermelha que hipnotizava e com certeza era ali a solidificação da minha personalidade.
[ ]
Republicado do dia 17/04/10
Simplismente maravilhoso.
ResponderExcluirMatheus Squefi.